Síncope
SÍNCOPE
Guia prático para avaliação, estratificação de risco e manejo da síncope no pronto-socorro. Inclui critérios de internação, prescrições e orientações de alta.
Paciente típico: Adulto jovem, previamente hígido, com episódio de perda súbita e transitória da consciência precedido por pródromos (tontura, sudorese, visão turva), após longo período em pé ou gatilho emocional, com recuperação espontânea em segundos.
🩺 Guia rápido
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História clínica típica
# História Clínica
Paciente relata que há ❓ horas apresentou episódio de perda súbita da consciência, com duração de aproximadamente ❓ segundos, precedido por sensação de tontura, sudorese, palidez e escurecimento visual. Refere que estava em pé há cerca de ❓ minutos em ambiente quente/abafado. Queda ao solo com recuperação espontânea, sem confusão pós-ictal. Nega palpitações, dor torácica, dispneia, déficits neurológicos ou trauma craniano significativo. Nega liberação esfincteriana ou movimentos tônico-clônicos.
História de ❓ episódios semelhantes prévios.
Nega cardiopatia conhecida, uso de medicações anti-hipertensivas ou antiarrítmicas.
Nega alergias medicamentosas.
# Exame físico
REG, consciente e orientado, normocorado, hidratado, acianótico, anictérico.
ACV: RCR 2T, BNF, sem sopros. Pulsos periféricos palpáveis e simétricos.
AR: MV presente bilateral, sem RA.
Abdome: plano, flácido, indolor, RHA+, sem VMG.
Exame neurológico sumário: sem déficits focais, pupilas isocóricas e fotorreagentes, movimentos oculares preservados, força e sensibilidade preservadas em 4 membros.
Ausência de sinais de trauma significativo.
# HD
- Síncope vasovagal
# Conduta
- Estratificação de risco: BAIXO RISCO
- Hidratação venosa se necessário
- Observação por 2-4 horas
- Orientações sobre medidas não-farmacológicas
- Alta hospitalar com orientações de retorno
- Encaminhamento ambulatorial se episódios recorrentes
Prescrição para paciente típico
No pronto-socorro:
OBSERVAÇÃO E HIDRATAÇÃO
01. Soro Fisiológico 0,9% 500mL – correr EV em ❓ horas (se sinais de desidratação)
02. Monitorização: PA, FC, SatO₂
# Se necessário (sintomas associados):
03. Bromoprida 10mg/2mL – 01 ampola (2mL) + 18mL SF0,9%, EV lento, se náuseas
04. Dipirona 1g/2mL (500mg/mL) – 01 ampola (2mL) + 18mL SF0,9%, EV lento, se cefaleia
Para casa:
MEDIDAS NÃO-FARMACOLÓGICAS (principal tratamento)
- Hidratação adequada: 2-3 litros de água por dia
- Aumentar ingesta de sal (se não contraindicado): 8-10g/dia
- Evitar gatilhos: ambientes quentes, multidões, jejum prolongado
- Reconhecer pródromos e sentar/deitar imediatamente
- Elevar membros inferiores ao sentir pródromos
- Manobras de contrapressão física: cruzar as pernas e contrair musculatura, apertar mãos (handgrip)
- Evitar mudanças bruscas de posição
- Levantar-se lentamente da cama ou cadeira
# Medicações (se sintomáticos):
01. Dipirona 500mg ––––––––––– 10 comprimidos
Tomar 01 comprimido, VO, de 6/6h, se dor ou febre
02. Paracetamol 750mg ––––––––––– 10 comprimidos
Tomar 01 comprimido, VO, de 8/8h, se dor ou febre (alternativa à dipirona)
🏥 NO PRONTO-SOCORRO
- ⚠️ MANEJO E CUIDADOS INICIAIS
- Avaliação ABC: vias aéreas pérvias, respiração adequada, circulação estável
- Tríade obrigatória: História clínica detalhada + Exame físico completo + ECG 12 derivações
- Definir se é síncope: perda COMPLETA da consciência + perda do tônus postural + recuperação espontânea e rápida sem sequelas
- Diferenciar de: convulsão (confusão pós-ictal prolongada, movimentos tônico-clônicos, mordedura de língua, liberação esfincteriana), hipoglicemia (verificar glicemia capilar), AVC/AIT (déficits neurológicos focais)
- Aferir PA em decúbito e ortostatismo: após 3 min em pé. Positivo se queda ≥20 mmHg na PAS ou PAS <90 mmHg
- Estratificação de risco (ver critérios abaixo)
- Solicitar exames se indicado: hemograma (suspeita anemia/sangramento), glicemia, eletrólitos, troponina (se dor torácica), βHCG (mulheres em idade fértil)
- Monitorização cardíaca contínua: apenas em pacientes de alto risco
- Hidratação venosa: se sinais de depleção volêmica
- Observação: 2-6 horas para baixo risco, internação para alto risco
-
CRITÉRIOS DE ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO
BAIXO RISCO (alta do PS):
- Idade <40 anos sem cardiopatia
- Pródromos típicos de síncope vasovagal (tontura, sudorese, náusea, palidez, visão turva)
- Gatilho claro: ortostatismo prolongado, ambiente quente/abafado, dor, medo, estresse emocional, pós-miccional, pós-prandial
- Ausência de cardiopatia estrutural ou DAC
- Exame físico normal
- ECG normal
- Recuperação completa e rápida
- História prévia de episódios similares benignos
ALTO RISCO (internação obrigatória):
- História clínica:
- Dor torácica nova ou dispneia
- Síncope durante esforço físico ou em decúbito
- Palpitações súbitas seguidas de síncope
- História de cardiopatia grave, DAC, ICC
- Ausência de pródromos ou pródromos <10 segundos
- História familiar de morte súbita <50 anos
- Exame físico:
- PAS <90 mmHg inexplicada
- FC <40 bpm persistente (acordado, sem esforço)
- Sopro cardíaco sistólico não diagnosticado
- Sangramento evidente ou oculto (toque retal)
- ECG:
- Alterações isquêmicas agudas
- Bradicardia sinusal <40 bpm ou pausa sinusal >3s
- BAV 2º grau Mobitz II, BAV 3º grau ou bifascicular
- QRS >120ms com BCRE ou BCRD
- FA com FC <40 bpm
- Síndrome de Brugada (padrão tipo 1)
- QTc >480ms ou <340ms
- Padrão de pré-excitação (Wolff-Parkinson-White)
- Ondas épsilon ou inversão T em V1-V3 (CAVD)
- Alterações sugestivas de cardiomiopatia hipertrófica
- Disfunção de marca-passo/CDI
RISCO INTERMEDIÁRIO (observação no PS ou encaminhamento imediato):
- Casos que não se enquadram claramente em baixo ou alto risco
- Idade >65 anos
- Comorbidades cardiovasculares sem critérios de alto risco
- ECG com alterações não específicas
- Síncope sem causa clara após avaliação inicial
- HIDRATAÇÃO VENOSA
- Prescrição prática:
Soro Fisiológico 0,9% 500-1000mL – correr EV em 2-4 horasRinger Lactato 500-1000mL – correr EV em 2-4 horas
- Indicações:
- Depleção volêmica evidente
- Hipotensão ortostática por desidratação
- Sinais de desidratação ao exame físico
- Incapacidade de hidratação oral
- Apresentações:
- Soro Fisiológico 0,9%: bolsas de 100mL, 250mL, 500mL, 1000mL
- Ringer Lactato: bolsas de 500mL, 1000mL
- Via(s): 💉 EV
- Cuidados:
- Evitar sobrecarga volêmica em cardiopatas
- Avaliar necessidade de reposição eletrolítica associada
- Monitorizar balanço hídrico
- Prescrição prática:
- ANTIEMÉTICO
- Prescrição prática:
Bromoprida 10mg/2mL – 01 ampola (2mL) + 18mL SF0,9%, EV lento (2-3 min), se náuseasBromoprida 10mg/2mL – 01 ampola, IM em deltoide, se náuseas
- Alternativas:
Ondansetrona 8mg/4mL (2mg/mL) – 01 ampola (4mL) + 16mL SF0,9%, EV lento, se náuseasMetoclopramida 10mg/2mL – 01 ampola (2mL) + 18mL SF0,9%, EV lento, se náuseas
- Indicações:
- Náuseas associadas ao episódio sincopal
- Sintomas autonômicos proeminentes
- Apresentações:
- Bromoprida: ampolas 10mg/2mL
- Ondansetrona: ampolas 4mg/2mL, 8mg/4mL
- Metoclopramida: ampolas 10mg/2mL
- Via(s): 💉 EV | 💉 IM
- Cuidados:
- Contraindicação: obstrução intestinal, feocromocitoma
- Risco de sintomas extrapiramidais (bromoprida, metoclopramida)
- Dose máxima bromoprida: 60mg/dia
- Dose máxima ondansetrona: 32mg/dia
- Cautela em idosos (risco de sedação)
- Prescrição prática:
- ANALGÉSICO / ANTITÉRMICO
- Prescrição prática:
Dipirona 1g/2mL (500mg/mL) – 01 ampola (2mL) + 18mL SF0,9%, EV lento (5-10 min), se dor ou febreDipirona 1g/2mL (500mg/mL) – 01 ampola, IM profundo em glúteo, se dor ou febre
- Alternativas:
Paracetamol 1g/100mL – 01 frasco, EV em 15 min, se dor ou febre
- Indicações:
- Cefaleia pós-sincopal (comum)
- Dor relacionada a trauma leve durante queda
- Febre (se investigar foco infeccioso)
- Apresentações:
- Dipirona: ampolas 1g/2mL (500mg/mL), 2,5g/5mL
- Paracetamol: frascos 1g/100mL
- Via(s): 💉 EV | 💉 IM | 💊 Oral
- Cuidados:
- Dipirona: infundir lentamente (risco hipotensão se EV rápido)
- Contraindicação dipirona: porfiria aguda, deficiência G6PD
- Paracetamol: dose máxima 4g/dia
- Ajustar dose em hepatopatas
- Prescrição prática:
- TRATAMENTO ESPECÍFICO PARA SÍNCOPE CARDÍACA
- Bradicardia sintomática:
Atropina 0,5mg/1mL – 01 ampola, EV em bolus, repetir se necessário (máx 3mg)- Considerar marca-passo transcutâneo se refratário
- Taquiarritmia com instabilidade:
- Cardioversão elétrica sincronizada
- Bloqueio AV avançado:
- Marca-passo temporário
- Internação em UTI
- Isquemia miocárdica:
- Seguir protocolo de SCA
- Estenose aórtica grave:
- Evitar vasodilatadores
- Encaminhamento para cirurgia cardíaca
- Bradicardia sintomática:
🏠 PARA CASA
- MEDIDAS NÃO-FARMACOLÓGICAS (principal tratamento para síncope vasovagal)
- Educação:
- Explicar o caráter benigno da síncope vasovagal
- Tranquilizar sobre baixo risco de complicações graves
- Alertar sobre risco de trauma em novo episódio
- Ensinar reconhecimento de pródromos
- Hidratação:
- Ingestão hídrica: 2-3 litros/dia
- Especialmente importante em dias quentes
- Ingesta de sal:
- 8-10g de sal/dia (se não houver contraindicação - hipertensão, ICC)
- Alimentos salgados nas refeições
- Evitar gatilhos:
- Ambientes quentes, abafados, com multidões
- Jejum prolongado
- Desidratação
- Álcool
- Ortostatismo prolongado
- Mudanças bruscas de posição
- Manobras de contrapressão física (ao sentir pródromos):
- Sentar ou deitar imediatamente
- Elevar membros inferiores
- Cruzar as pernas e contrair musculatura de MMII e abdome
- Apertar as mãos (handgrip) com força máxima por 30s
- Colocar cabeça entre os joelhos se sentado
- Mudanças posturais:
- Levantar-se lentamente da cama (sentar na beira por 1-2 min)
- Evitar levantar-se rapidamente de cadeiras
- Evitar rotação rápida da cabeça (se síndrome seio carotídeo)
- Educação:
- MEDICAÇÕES SINTOMÁTICAS
- Analgésico:
Dipirona 500mg – Tomar 01 comprimido, VO, de 6/6h, se dor ou febreParacetamol 750mg – Tomar 01 comprimido, VO, de 8/8h, se dor ou febre
- Cuidados:
- Usar apenas se sintomas
- Dipirona: evitar uso prolongado
- Paracetamol: não exceder 4g/dia
- Analgésico:
-
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO ESPECÍFICO (apenas se síncope recorrente refratária)
Para síncope vasovagal recorrente:
- Midodrina (agonista alfa-adrenérgico):
Midodrina 2,5-10mg – Tomar 01 comprimido, VO, 3x/dia (8h, 14h, 18h)- Indicação: episódios recorrentes apesar de medidas não-farmacológicas
- Apresentações: comprimidos 2,5mg, 5mg
- Cuidados: evitar dose noturna (risco HAS supina), contraindicação em HAS grave, ICC, DRC, feocromocitoma
- Iniciar com 2,5mg 3x/dia e aumentar conforme resposta
Para hipotensão ortostática:
- Fludrocortisona (mineralocorticoide):
Fludrocortisona 0,1mg – Tomar 01 comprimido, VO, 1x/dia pela manhã- Indicação: hipotensão ortostática sintomática recorrente
- Dose: 0,05-0,2mg/dia
- Apresentações: comprimidos 0,1mg
- Cuidados: monitorizar PA, K+, risco de hipocalemia, retenção hídrica, contraindicação em ICC descompensada
Obs: medicações específicas geralmente são iniciadas em ambiente ambulatorial especializado
- Midodrina (agonista alfa-adrenérgico):
- REVISÃO DE MEDICAÇÕES EM USO
- Avaliar e considerar suspensão/redução de:
- Anti-hipertensivos (IECA, BRA, diuréticos, alfa/beta-bloqueadores)
- Vasodilatadores (nitratos, bloqueadores de canal de cálcio)
- Antidepressivos tricíclicos
- Fenotiazinas
- Antiparkinsonianos
- Alfabloqueadores prostáticos
- Discutir risco-benefício com paciente
- Monitorizar PA após ajustes
- Avaliar e considerar suspensão/redução de:
-
👨🏻⚕️ Orientações ao paciente
Sinais de alerta - retornar imediatamente se:
- Novo episódio de síncope
- Dor torácica ou palpitações
- Falta de ar (dispneia)
- Síncope durante esforço físico ou em decúbito
- Síncope sem pródromos ou com pródromos muito curtos
- Confusão mental persistente
- Déficit neurológico focal (fraqueza, alteração de fala, alteração visual)
- Sangramento digestivo (fezes escuras ou vômitos com sangue)
- Trauma craniano após queda
Recuperação e seguimento:
- Recuperação esperada: imediata após o episódio
- Se sintomas persistentes (fadiga, mal-estar): podem durar algumas horas
- Retornar ao trabalho/atividades: geralmente no mesmo dia se episódio isolado
- Restrições de atividades:
- Evitar dirigir por pelo menos 7 dias após síncope (especialmente se sem pródromos)
- Evitar atividades de risco (trabalho em altura, operar máquinas pesadas, natação sem supervisão) até avaliação definitiva
- Atletas: liberar exercícios após avaliação cardiológica
- Seguimento ambulatorial:
- Cardiologia: se >1 episódio, história familiar de morte súbita, cardiopatia, ECG alterado
- Neurologia: se suspeita de epilepsia ou causa neurológica
- Clínica médica: acompanhamento de rotina
Prevenção de quedas:
- Manter ambiente doméstico seguro (remover tapetes, boa iluminação)
- Usar calçados adequados
- Instalar barras de apoio em banheiro se idoso
Dieta:
- Alimentação regular (evitar jejum prolongado)
- Evitar refeições muito volumosas (risco hipotensão pós-prandial)
- Evitar álcool (vasodilatador)
Estilo de vida:
- Dormir adequadamente (7-8h/noite)
- Evitar estresse excessivo
- Praticar exercícios regulares (após liberação médica)
- Manter peso adequado
🔎 CID-10:
- R55: Síncope e colapso
- I95.1: Hipotensão ortostática
- G90.3: Síndrome de hipersensibilidade do seio carotídeo
- I49.9: Arritmia cardíaca não especificada (se síncope arritmogênica)
- I35.0: Estenose aórtica (se síncope por causa estrutural)